Competências de um doutor

Um doutorado inicia-se com a escrita de um projeto contendo pelo menos uma questão original. Essa questão é avaliada e o projeto se transforma em uma tese que é defendida em um evento público. De maneira simplista, esses são os passos para a obtenção de um título de doutor.

Além de ser aprovado na defesa de tese, o doutorando almeja produzir um documento relevante e de alta qualidade. Esses também são os anseios dos programas de pós-graduação e dos orientadores, pois esses documentos respaldados pelo método científico podem gerar papers. Mas, do ponto de vista de formação para o mercado, seja academia ou indústria, quais competências esse recém-doutor deve ter?

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Vários fatores são basilares para a geração de doutores de alta qualidade. Entre eles, é possível destacar:

Orientação: o orientador deve ser especialista na área do projeto de pesquisa e deve ter tempo para trabalhar com o aluno;

Instituição: o ambiente de pesquisa no qual o aluno está inserido deve propiciar condições para que a pesquisa seja desenvolvida tanto em relação a equipamentos/infra-estrutura quanto em relação ao convívio com outros pesquisadores; e,

Financiamento: o aluno deve ter acesso a recursos financeiros para dedicar-se ao doutorado.

Entretanto, esses três fatores são necessários mas não garantem o sucesso. Daí surge a pergunta: como verificar se um doutorando reune as competências para se tornar doutor? Ao perguntar quais competências o doutorando precisar ter para obter o título de doutor, a resposta mais comum é provavelmente a seguinte: você deve ser um especialista em sua área de pesquisa e, além disso, deve ser capaz de desenvolver pesquisa de alto nível sem a ajuda do seu orientador e, também, deve ser capaz de ajudar na formação de uma nova geração de pesquisadores.

Diante da resposta dada no parágrafo anterior, não é possível delinear de maneira clara e precisa quais são as exigências/competências requeridas para se tornar um doutor. Essa imprecisão gera desconforto e insegurança no doutorando e não ajuda o programa de pós-graduação a aferir a qualidade de seus formandos. Com o intuito de iniciar uma discussão e minimizar esse desconforto, descrevo a seguir algumas competências que são vitais para a formação de um doutor.

Conhecimento

O doutorando deve conhecer muito bem a área de pesquisa do seu doutorado e deve ter conhecimento profundo em uma das linhas de pesquisa dessa área. Por exemplo: um pesquisador que trabalha na linha de pesquisa de “sistemas de múltiplos classificadores” deve ter um bom conhecimento em aprendizagem de máquina.

Pensamento crítico

A busca pela questão de pesquisa, que será o foco do doutorado, passa pela análise crítica de trabalhos previamente publicados. Ao lermos trabalhos da literatura, devemos não apenas absorver o conhecimento neles acumulados, mas também, devemos ponderar sobre possíveis caminhos não percorridos. Importante destacar que essa análise deve ser balizada por hipóteses plausíveis que diminuam o amplo espectro de possibilidades caso adotássemos uma busca cega baseada em tentativa e erro. Dica: fique alerta se você não encontra possíveis alternativas ou pontos de melhorias nos trabalhos que lê.

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Habilidade para realizar experimentos

Delinear o protocolo para realizar um experimento correto, no qual a pergunta de pesquisa será respondida a contento, é uma competência requerida e que deve ser aprendida ao longo do doutorado. Durante o planejamento dos experimentos, questione (lista não exaustiva) se o tamanho da amostra é adequado, se nenhum erro foi cometido, se os métodos selecionados são apropriados e se o aparato estatístico está aderente aos dados que você possui. Ao realizar experimentos, deve-se estar atento ao viés de confirmação. Este viés ocorre quando o pesquisador está tão imerso em sua pesquisa que não consegue enxergar alguns pontos cruciais que podem afetar a plausibilidade de suas conclusões. 

Habilidade para trabalhar em grupo e liderança

Para se trabalhar bem em equipe, é necessário ganhar a confiança do grupo, ser respeitoso, firme e empático. Assim, seja como aluno de doutorado, como orientador, após finalizar seu doutorado e ingressar na vida acadêmica, ou como empregado em uma indústria, certamente você trabalhará em uma equipe. Em todos esses ambientes, o mais importante é trabalhar como uma equipe e não apenas trabalhar em uma equipe. Para que uma equipe funcione bem é preciso um líder. No caso específico de uma equipe formada por um orientador e seus alunos, o orientador é o líder e, ele deve gerenciar os liderados sabendo que cada um possui uma pesquisa particular e que cada orientação é diferente.

Comunicação

A última etapa do método científico é “reportar os resultados/conclusões”. Assim, habilidades de escrita e de exposição oral do trabalho são mandatórias para melhor divulgar a pesquisa. Na vida acadêmica, as pesquisas são compartilhadas com a comunidade científica através de artigos em revistas e em congressos. Além disso, as agências de fomento, que concedem financiamento para a pesquisa, avaliam pedidos de projetos de pesquisas. Logo, artigos e projetos de pesquisa mal-escritos serão recusados.

Resiliência e determinação 

Pesquisa é um processo de se aventurar pelo desconhecido. Ao investigar um problema original e importante, inerentemente, o doutorando desbravará terras inexploradas. Nessa aventura, é necessário ser resiliente e determinado para não desistir antes do término. Adianto que tais características de sobrevivência serão bastante úteis na vida futura do doutor.

As competências listadas não estão em ordem de importância. Mas, juntas, elas compõem um corpo de atributos que fortalece os alicerces para a formação de um bom profissional que poderá atuar tanto na academia quanto na indústria. Vale destacar que, num passado recente, formava-se doutor para a academia. Dessa forma, o foco da formação estava em prover ao futuro doutor capacidades para realizar pesquisa. Pouca atenção era dada para outras competências, tais como trabalho em grupo e comunicação, hoje indispensáveis.

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