Detecção de Fake News

A imensa quantidade de informação e de notícias veiculadas nas redes sociais traz desafios enormes. Um deles é o combate às fake news.

Não existe um consenso na comunidade científica sobre a definição de fake news. De maneira mais abrangente, adota-se que fake news é notícia falsa. Por outro lado, pode-se restringir e definir fake news como uma notícia que foi intencionalmente produzida para ser falsa e que pode ser verificada como tal. Essa definição mais restrita exclui, por exemplo, sátira e sarcasmo que não têm como objetivo enganar o leitor.

Estima-se que, em 2022, foram enviados 500 milhões de tweets por dia; e está é, dentre muitas, apenas uma rede social. Logo, a inspeção manual de texto veiculados na Internet é inviável não apenas pela quantidade, mas também, pela necessidade de especialistas humanos com pouco viés para realizar a curadoria de tais textos.

Logo, é preciso automatizar o processo! A inteligência artificial é a tecnologia mais viável atualmente para realizar a tarefa de separar rapidamente notícias falsas de verdadeiras.

Faramarz Farhangian, Rafael M.O. Cruz, George D.C. Cavalcanti. Fake news detection: Taxonomy and comparative studyInformation Fusion, 2024.

Neste artigo, analisamos as principais tecnologias para a área de detecção de fake news. Todas as tecnologias avaliadas pertencem à área de aprendizagem de máquina (um campo da inteligência artificial) que é capaz de extrair informação de massas de dados sem a intervenção humana no processo de aprendizagem. Foram comparados 15 métodos de representação de texto (entre eles, métodos atuais como transformers para large language models) e 20 modelos de aprendizagem de máquina (5 clássicos, 3 ensemble learning e 12 deep learning).

Além da taxonomia atualizada da área, apresentamos um estudo comparativo usando várias abordagens do estado-da-arte. Após a análise dos resultados, dentre as conclusões, observou-se que a combinação de diferentes abordagens leva a uma melhora da predição final do sistema de detecção de fake news. Constatou-se também que a técnica ideal de representação dos textos depende do banco de dados sob análise; mas, vale destacar que os modelos baseados em transformers exibem, consistentemente, um desempenho superior.

Por fim, tendo como base as análises realizadas no artigo, são propostas várias perspectivas de pesquisas futuras para o amadurecimento da área, tais como: emprego de várias representações (multi-view learning) e de sistemas de combinação dinâmica de classificadores.

O código-fonte de todas as análises estão publicamente acessíveis no GitHub: https://github.com/FFarhangian/Fake-news-detection-Comparative-Study.

GPT e modelos de linguagem: disciplina da pós-graduação do CIn-UFPE 

Finalizamos, eu e o prof. Tsang, a primeira disciplina do CIn a abordar Generative Pre-trained Transformer (GPT) e Large Language Models (LLM), intitulada: GPT: métodos e desafios de modelos de linguagem. A disciplina foi oferecida para alunos de mestrado e de doutorado da pós-graduação em Ciência da Computação do CIn-UFPE.

Ao ser lançado, o ChatGPT nos fez refletir sobre várias possíveis direções quanto ao seu uso e quanto ao alcance de suas potencialidades. Aplicações como tradução, sumarização de documento, construção de textos, entre outras, atingiram novos patamares e deixaram vários métodos/estratégias/algoritmos obsoletos. 

Para a construção de plataformas semelhantes ao ChatGPT, diversas tecnologias foram agregadas de forma inteligente para obtermos os resultados que enxergamos hoje. Uma dessas tecnologias consta na sigla do GPT, o “T” é de  Transformers (mais detalhes neste link) que é uma rede neural para treinar LLMs em grandes bancos de dados. 

Os LLMs transformaram a área de processamento de linguagem natural e compõem a base de uma ampla gama de sistemas de última geração que têm demonstrado uma excelente capacidade de gerar textos legíveis e fluidos. Porém, como toda nova tecnologia, esses modelos trazem consigo novos desafios, entre eles, desafios relacionados a aspectos éticos e de escalabilidade. A disciplina focou em fundamentos e, também, em diversos aspectos relacionados ao uso destes modelos.

Nesta primeira edição, o curso contou com a participação de 27 alunos (13 de doutorado e 14 de mestrado). Os orientadores desses alunos, no programa de pós-graduação do CIn, formam um grupo heterogêneo composto por 16 professores que atuam em diversas áreas, tais como: inteligência artificial, aprendizagem de máquina, ciência de dados, otimização, realidade aumentada e engenharia de software. 

Esta diversidade trouxe desafios, mas, foi frutífera, em especial, nas discussões que expuseram pontos de vistas que, embora convergentes, tinham alvos díspares. Por outro prisma, esta diversidade também reforça a ubiquidade da aprendizagem de máquina nas mais diversas áreas de pesquisa.

Sigamos para a próxima edição!

Transformers: a tecnologia por trás do ChatGPT

Sistemas que extraem informações de grandes quantidades de textos (large language models – LLM) têm despertado os mais diferentes sentimentos e atiçado o interesse de variados setores da sociedade. Um exemplo de LLM é o ChatGPT que conseguiu atingir a incrível marca de mais de um milhão de usuários em apenas cinco dias após seu lançamento.

Embora o ChatGPT tenha causado bastante “barulho” nos últimos meses, a tecnologia que o tornou possível vem sendo desenvolvida há tempos.

A “magia” por trás do ChatGPT deve-se, principalmente, a um tipo de arquitetura de rede neural artificial chamada de Transformers que foi lançada num artigo da Google de 2017 intitulado Attention is all you need. Lembrando que o T da sigla GPT significa Transformer; Generative Pre-trained Transformer (GPT).

A arquitetura do Transformer (mostrada na figura acima) é composta de vários módulos e parece complicada de início, porém, notem que vários módulos se repetem. Neste post, foco nas três principais inovações que tornaram essa tecnologia realidade:

  • Positional encoding;
  • Attention;
  • Self-attention.

A primeira, positional encoding, objetiva atribuir ordem as palavras de uma sentença quando apresentadas a modelos de aprendizagem de máquina. Já as duas seguintes, attention e self-attention, buscam pelas partes (palavras) mais importantes das sentenças. Mais detalhes a seguir.

Positional encoding

A ordem das palavras numa sentença importa. Logo, ao apresentar uma sentença a uma máquina de aprendizagem, é relevante informar para esta máquina a ordem das palavras. Esta é a tarefa do positional enconding.

De maneira simples, podemos dizer que o positional encoding atribui um número para cada palavra da sentença. Por exemplo: a frase

“Vamos jogar vôlei”

seria representada assim

[(“Vamos”, 1), (“jogar”, 2), (“vôlei”, 3)].

Esta é uma operação crucial, pois as redes neurais artificiais não levam em conta a ordem das palavras que lhes são apresentadas. Desta forma, a rede neural pode aprender que a primeira palavra está atrelada ao “1”, a segunda ao “2” e assim por diante.

Antes dos Transformers, as redes neurais recorrentes (RNN) atacaram esta questão da ordem das palavras de uma maneira diferente. Ao invés de apresentar todas as palavras da sentença de uma vez, as RNNs apresentavam uma palavra por vez à rede. Assim, a primeira palavra da sentença era apresentada à rede, em seguida, a segunda palavra e assim por diante. Mas, esta estratégia possui um alto custo de processamento e dificulta a paralelização das operações durante o treinamento da rede. Além disso, o trabalho de “entender” a ordem era atribuído à rede, no caso das RNNs, enquanto que nos Transformers, esta responsabilidade foi incorporada aos dados fornecidos como entrada para a rede.

Vale destacar que a estratégia usada no Transformer é mais sofisticada do que o exemplo mostrado acima que apenas atribuir números a cada palavra. Uma codificação usando as funções seno e cosseno, com diferentes frequências, são usadas para este fim. Mais detalhes sobre esta codificação pode ser encontrada aqui e aqui.

Attention

Antes de iniciar esta parte, lembremos que o artigo seminal do Transformer foi intitulado Attention is all you need. Logo, “attention” está no título do artigo e possui um papel crucial.

O conhecimento necessário para se chegar ao ponto que estamos em relação aos LLMs representa um aglomerado de experiências prévias. Neste sentido, o conceito de attention para a tradução foi descrito no artigo Neural machine translation by jointly learning to align and translate, em 2015.

Neste artigo, os autores destacam a importância de ter uma visão geral do texto para realizar uma tradução, por exemplo, de uma sentença do inglês para o francês de maneira mais acurada. Para ilustrar o conceito, a sentença

The agreement on the European Economic Area was signed in August 1992.”

pode ser traduzida para

L’accord sur la zone économique européenne a été signé en août 1992.”.

Perceba que quando da tradução de “European Economic Area” para “la zone économique européenne“, existe uma troca de ordem entre palavras. Além disso, francês, assim como o português, é uma língua na qual é necessário ajustar os adjetivos “économique” e “européenne” para o feminino por causa do termo “la zone“. Essas restrições dificultam bastante a possiblidade de se fazer uma tradução palavra-a-palavra de uma língua para a outra, como era comum em abordagens prévias.

Ainda no artigo de 2015, os autores mostram o heatmap, copiado acima, que relaciona cada palavra da sentença em inglês com palavras da sentença em francês. Perceba que devido à mudança de ordem das palavras de uma língua para a outra, neste heatmap, a palavra “European” está fortemente relacionada às palavras “économique” e “européenne“. Assim, este heatmap ilustra o mecanismo de attention que tem o objetivo de olhar para as diferentes alternativas quando da tradução.

Self-attention

A intuição por trás de self-attention é que nós não damos a mesma importância a todas as palavras em uma sentença. Logo, self-attention é um mecanismo que cria um relacionamento entre palavras de uma mesma sentença, com o intuito de focar em algumas, enquanto outras palavras recebem pouca atenção.

Tal mecanismo pode ajudar no processo de desambiguação entre palavras que possuem a mesma escrita e significados diferentes, por exemplo.

Observe estas duas sentenças:

“O real continua pouco valorizado comparado ao euro.”

“Isto não é real; estamos num ambiente virtual.”

A palavra real nas duas sentenças possuem significados diferentes e ao olhar para as outras palavras de cada sentença, podemos inferir o seu verdadeiro significado. Isso é realizado de maneira direta por humanos, simplesmente olhando as palavras ao redor.

Desta forma, na primeira sentença, a palavra “real” pode ser correlacionada a palavra “euro” e, assim, entende-se que o assunto trata de moedas. Já na segunda, a palavra “real” relaciona-se mais fortemente com a palavra “virtual”, e daí, inferimos que a palavra “real” não se trata de moeda, como na primeira sentença.


Não apenas o ChatGPT se beneficiou de Transformers. A lista é longa, entre elas: GPT, GPT-2, GPT-3, GPT-4, BERT, ALBERT, RoBERTa, DistilBERT e XLNet.

Seleção dinâmica de one-class classifiers

Mesmo sendo desenvolvidos para problemas que tenham apenas dados de uma classe, one-class classifiers (OCCs) também podem ser usados para tarefas que possuem várias classes. Nesse caso, um OCC é treinado para cada classe. Logo, para uma tarefa com n classes, n OCCs serão treinados. A classificação de uma nova instância é realizada da seguinte forma: essa instância é fornecida como entrada para cada um dos OCCs e sua classe é definida como a classe do OCC que responder com maior certeza.

Entretanto, quando uma nuvem de instâncias é multimodal, ou seja, quando essa nuvem possui mais de um grupo, boa parte dos OCCs não consegue lidar com essa dificuldade. Suponha que os pontos vermelhos na figura (a) acima pertençam à classe target e os pontos verdes à classe outlier. Vale destacar que durante o processo de treinamento do OCC, apenas os pontos vermelhos estão disponíveis. Assim, os pontos em verde são mostrados na figura apenas para fins de ilustração. A elipse em preto representa o classificador OCC e engloba todos os pontos vermelhos, dividindo a área do espaço de características em duas: target (dentre da elipse) e outlier (fora da elipse). Nessa figura, é possível notar que vários exemplos da classe outlier estão localizados dentro da região delimitada pelo OCC e, por consequência, esses pontos são incorretamente classificados como pertencentes à classe target. Nota-se também que as instâncias em vermelho compõem uma classe multimodal, ou seja, formada por várias modas/grupos.

Uma alternativa para lidar com essa multi-modalidade é criar várias meta-classes, uma para cada grupo, e treinar um OCC por grupo. Logo, uma nuvem de pontos (uma classe) será representada por vários OCC, um para cada meta-classe ou grupo. O desafio é definir o número de grupos em uma nuvem de pontos e, para esse fim, pode-se usar cluster validity indices para estimar este número.

Entretanto, não existe um índice (cluster validity index) que consiga definir de maneira precisa todos os grupos de qualquer nuvem de pontos, pois tal tarefa depende da medida de distância usada, da estrutura dos dados e de outras características. Em outras palavras, um dado índice pode ser a melhor escolha para uma classe e não ser para outra. Logo, esse mapeamento, do melhor índice por classe, é um problema em aberto.  Além disso, quando os cluster validity indeces são aplicados a uma dada nuvem de pontos, eles podem separar essa nuvem de maneiras diferentes.  Por exemplo, o índice Silhouette pode indicar que a nuvem possui 3 grupos, enquanto o índice NbClust pode indicar 5 grupos.

Diante deste contexto, foi proposto o método One-class Classifier Dynamic Ensemble Selection for Multi-class problems (MODES) que é um sistema de seleção dinâmica de classificadores para tarefas multi-classe. O MODES usa vários índices e treina um OCC para cada grupo definido por cada um dos índices. Essa estratégia permite que a diversidade das informações extraídas pelos índices seja incorporada ao sistema através do treinamento de vários OCCs. Por exemplo: a figura (b) ilustra que um dado cluster validity index encontra dois grupos; assim, dois OCC são treinados, um para cada grupo. Já outros cluster validity indexes encontram 4 e 5 grupos, como mostrado nas figuras (c) e (d), respectivamente; e, mais nove OCCs são treinados. Assim, cada OCC torna-se um especialista em uma determinada área do espaço de caraterística e minimiza o erro de classificar um outiler como target, como ocorre na figura (a).

Vale destacar que no MODES cada classe é tratada individualmente, logo, desbalanceamento entre as classes não é uma preocupação. Além disso, estratégias que decompõem as classes, como é o caso do MODES, podem se apresentar como alternativas interessantes para incremental learning e para open-set recognition

O MODES propõe uma abordagem capaz de lidar com dados que possuem distribuições complexas usando uma estratégia que seleciona dinamicamente os OCCs mais competentes para cada uma das instâncias de teste.


Rogério CP Fragoso, George DC Cavalcanti, Roberto HW Pinheiro, Luiz S Oliveira. Dynamic selection and combination of one-class classifiers for multi-class classification. Knowledge-based Systems, 2021.

One-class classification

Os classificadores tradicionais, tais como árvores de decisão e multi-layer perceptrons, recebem como entrada instâncias de duas ou mais classes e dividem o espaço de características em regiões de forma que cada classe seja representada por uma ou mais regiões. Logo, instâncias de classes diferentes são usadas para melhor definir as bordas entre regiões.

De maneira diferente, one-class classifiers (OCCs) recebem instâncias de apenas uma classe e dividem o espaço de características em apenas duas regiões: target (instâncias que pertencem à classe-alvo) e outliers (instâncias que não pertencem à classe-alvo). Assim, o objetivo de OCCs é determinar se uma dada instância de teste pertence à classe-alvo.

A imagem acima mostra um OCC, representado pela curva em vermelho, que delimita a área do espaço de caraterísticas para a classe-alvo, formada por cajus. Ou seja, todas as instância que se encontram dentro desta região serão ditas cajus e todas as instâncias fora desta região serão classificadas como não-cajus. Logo, esse classificador é potencialmente capaz de distinguir cajus de quaisquer outras frutas e/ou objetos.

Vale ressaltar que em seu processo de treinamento, os OCCs não usam contra-exemplos, pois apenas instâncias da classe-alvo estão disponíveis. Desta forma, os OCCs não dispõem de informação entre as classes para melhor posicionar a fronteira de decisão (curva em vermelho na figura). Em contraste, como apenas uma classe é usada no treinamento, desbalanceamento não é um problema.

Uma maneira simples de construir um OCC é mostrada na figura acima. Nela, um OCC é representado por um círculo em azul. Este círculo foi definido da seguinte forma: primeiro, calcula-se o centro de massa das instâncias (cajus) e, em seguida, define-se um raio que pode ser ajustado de várias formas, por exemplo, como a distância do centro de massa ao caju mais distante.

Nesta figura, três cajus ficaram fora do círculo, logo, estes cajus são classificados como não-cajus, gerando erros de falsos negativos. Além disso, percebem-se espaços vazios dentro do círculo, pois a região de decisão não se ajustou tão bem aos dados de treinamento como no exemplo mostrado na primeira figura.

Um falso positivo ocorre quando uma instância se localiza dentro do círculo e esta instância é, por exemplo, um maracujá, ou seja, um não-caju. Logo, a definição do raio possui um papel fundamental para minimizar os erros de falso negativo e de falso positivo. Quanto menor o raio, maior o erro de falso negativo e menor o erro de falso positivo. Em contrapartida, quanto maior o raio, menor o erro de falso negativo e maior o erro de falso positivo. Assim, podemos pensar nestes dois erros como uma balança, quando um aumenta o outro diminui e vice-versa.

OCCs representam uma classe de classificadores composta por vários algoritmos de treinamento, entre eles: one-class support vector machine, support vector data description, auto-encoder neural network e isolation forest.

Aplicações

OCCs têm encontrado uso nas mais diversas aplicações, tais como: detecção de imagens e de eventos, biometria, detecção de falsificação, classificação de documento e detecção de mudança de conceito. A seguir são descritas três áreas mais abrangentes da aprendizagem de máquina que têm se beneficiado do emprego de OCCs.

OCCs podem ser usados para tarefas multi-classe de maneira que cada classe é modelada por um OCC. Assim, tem-se m OCCs, sendo m o número de classes da tarefa. A inferência da classe de uma instâncias de teste é realizada da seguinte forma: esta instância de teste é fornecida como entrada para cada um dos OCCs e o OCC com o maior grau de certeza indicará a classe.

Detecção de anomalia e de outliers são aplicações nas quais OCCs se apresentam como uma alternativa interessante. Nestas aplicações, deseja-se separar um conjunto de instâncias ditas “normais” de instância que não se encaixam nesta “normalidade”.

Em tarefas com múltiplas classes, open set recognition tem o objetivo de considerar que uma dada instância de teste pode não pertencer a nenhuma das m classes iniciais do sistema. Pode-se considerar este processo como a rejeição da instância de teste, pois a instância não é atribuída a nenhuma das m possíveis classes. Num futuro, este mesmo sistema pode aumentar o número de classes m para incorporar estas instâncias que diferiram das classes preexistentes.

Normalização dos atributos & Desempenho dos classificadores

Pré-processar os dados, antes de treinar uma máquina de aprendizagem, é uma etapa vital para se conseguir extrair o melhor de cada máquina. São várias as formas de pré-processar os dados e esta tarefa depende da aplicação em investigação. Por exemplo: em processamento de linguagem natural, é comum realizar a tokenization que objetiva separar sentenças em unidades menores, tais como palavras.

O foco desta post é o pré-processamento dos atributos com o objetivo de colocá-los em uma mesma escala, ou dentro de um mesmo critério, com o intuito de minimizar a influência indevida de um atributo sobre o outro. Esta tarefa é realizada por técnicas de scaling, muitas vezes chamadas de normalização.

Min-max scaler é a mais utilizada e difundida técnicas de scaling. Nela, cada um dos atributos é ajustado para caber em um intervalo, geralmente, entre 0 e 1. Outras técnicas de scaling permeiam as aplicações e, entre elas, destaco: standard scaler, maximum absolute scaler, robust scaler e quantile transformer.

Diante desse contexto com várias técnicas de scaling e vários classificadores, alguns questionamentos emergem:

  • Vale a pena normalizar os dados?
  • A escolha da técnica de scaling influencia no desempenho dos modelos de aprendizagem?
  • Qual técnica escolher para um dado classificador?
  • Quais classificadores são mais sensíveis às escolhas das técnicas de scaling?

Estas e outras questões são abordadas no artigo de Amorim et al. que realiza uma ampla avaliação usando 82 bancos de dados públicos e cinco técnicas de scaling. Foi mostrado que escolher bem a técnica de scaling melhora a precisão de classificadores. Em particular, algoritmos baseados em árvores de decisão são pouco sensíveis à escolha da técnicas de scaling. Logo, em alguns casos, não normalizar pode ser a melhor opção.

O nível de desbalancamento do banco de dados é um fator que influencia a escolha da técnica de scaling. O standard scaler obteve melhor desempenho em bancos de dados com baixos níveis de desbalanceameto, enquanto o quantile transformer apresenta-se como a melhor escolha para os níveis médio e alto de desbalanceamento.

Os autores também ressaltam que a melhor técnica de scaling para um sistema de múltiplos classificadores coincide com a melhor técnica empregada por seu classificador-base. Assim, a definição da melhor técnica de scaling, para um sistema de múltiplos classificadores, pode ser realizada avaliando o comportamento das técnicas em um classificador-base, o que torna todo o processo mais rápido e barato.

Sabendo que o emprego de técnicas de scaling é bastante negligenciado nas mais diversas aplicações, Amorim et al. colocam luz nesta questão e mostram que devemos ficar alertas em relação a esse ponto sensível, pois a escolha da técnica influencia significativamente o desempenho de modelos de classificação.

Lucas B.V. de Amorim, George D.C. Cavalcanti, Rafael M.O. Cruz, The choice of scaling technique matters for classification performance, Applied Soft Computing, 2023.

Como irritar seu orientador?

Em post anterior, discuti as atribuições do orientador que representam apenas uma parte da engrenagem. A orientação é um trabalho em conjunto, uma parceria. Logo, é fundamental que os alunos saibam quais são suas atribuições e obrigações. Estar plenamente consciente, em relação às responsabilidades de cada parte, torna a jornada mais simples. Além do mais, fazer um doutorado é, por si só, uma aventura desafiadora.

Uma maneira de abordar a questão, sobre as responsabilidades do aluno, é listar o que se espera de um bom estudante. Entretanto, vou focalizar o problema por uma perspectiva diferente. Ao invés de elencar os desejáveis atributos de um aluno, vou indicar os comportamentos dos alunos que mais irritam os orientadores. Assim, caso um estudante deseje contrariar o orientador e fazê-lo perder a paciência, esse será seu guia.

Sumir

Simplesmente, desapareça. Não responda e-mail. Não se comunique nem por sinal de fumaça. Essa é a maneira mais simples de irritar seu orientador. Durante o período de orientação, o aluno e o orientador devem ter reuniões regulares e, provavelmente, várias reuniões curtas, diria até, informais. O estudante deve aproveitar esses momentos não apenas para se familiarizar no enredo da pesquisa, mas também para melhor entender o microcosmos da academia.

Entregar um relatório desleixado

Avaliar um relatório mal escrito, mal formatado e desorganizado é uma tarefa desagradável. Se o próprio autor do relatório não é zeloso com sua obra, por que os outros devem ser? O estudante deve cuidar de todos os detalhes: fonte, espaçamento, figuras, tabelas, equações, referências, uso correto da linguagem, escrita científica, entre outros. Vale destacar que o orientador não é um corretor ortográfico e nem um professor de português (ou de inglês). Ele é o especialista no assunto da pesquisa. Assim, não desperdice o tempo dele com atividades simples que você poderia facilmente realizar, como usar um corretor ortográfico. Dica: ao finalizar o relatório, guarde-o por um tempo e depois releia-o prestando atenção tanto à forma quanto ao conteúdo. Você, provavelmente, encontrará vários pontos de melhoria antes de enviá-lo ao seu orientador.

Não cumprir prazos

Prometeu, cumpra. Se não está certo de quanto tempo necessitará para escrever um relatório, para sintetizar os artigos do estado-da-arte ou para avaliar/implementar um técnica, simplesmente infome que precisa de uns dias para melhor estimar e planejar as atividades. Porém, depois que o cronograma estiver pronto, informe o seu orientador e cumpra-o. Imprevistos ocorrem com todos. Entretanto, não informar que irá se atrasar e não explicar o motivo, fere o acordo previamente firmado.

Pedir ajuda antes de tentar resolver o problema sozinho

“Professor, como faço para adicionar uma equação no Latex? Qual é a data da matrícula?” Esse tipo de pergunta, certamente, deixará o orientador irritado, pois, com um mínimo de pró-atividade, o aluno resolveria essas questões facilmente. Para a primeira questão, resolva conversando com outros estudantes ou buscando na Internet, google it! Já para a segunda questão, uma ida a secretaria, ou ao site do programa, seria suficiente. Novamente, não gaste o tempo do seu orientador com atividades pouco proveitosas para o âmago do seu doutorado.

Sair da reunião sem a menor noção do que foi discutido

Ao final de uma reunião com o orientador, o aluno sai com algumas tarefas definidas. Ao regressar à sala do orientador, quinze dias depois, o aluno informa ao orientador que não realizou o experimento acordado, pois não entendeu o que foi solicitado na reunião. Para sanar esse tipo de situação: pergunte! Peça ajuda. O orientador não lerá a sua mente. Dica para o orientador: peça para o aluno lhe explicar o que foi planejado para os próximos dias. Visto que, o aluno só conseguirá explanar o que entendeu. Dica ao aluno: ao final da reunião escreva uma e-mail/ata com o que foi discutido e acordado na reunião. Caso o aluno tenha esquecido algo, ou incompreendido algum ponto, o orientador estará ciente e poderá auxiliar.

Concordar com tudo o que o orientador diz

Concorda com tudo? Esse é o seu doutorado! No início é natural que você concorde com muito do que é dito pelo orientador; além do mais, ele é o pesquisador experiente. Mas, ao longo do percurso, o aluno deve amadurecer e começar a liderar algumas iniciativas relacionadas ao desenvolvimento da pesquisa.


As principais causas de conflitos entre alunos e orientadores são: i) os alunos reclamam da falta de feedback do supervisor e ii) os orientadores reportam falta de habilidade em pesquisa do aluno.

Diante do exposto, é dever de ambos manter uma relação respeitosa, amigável e construtiva. Mas, do ponto de vista do estudante, ele pode controlar melhor a relação se: i) cumprir os prazos, ii) preparar-se para as reuniões, iii) estar aberto a receber críticas, e iv) demonstrar conhecimento e amadurecimento na área da pesquisa.

Atribuições do orientador

Vários fatores podem influenciar a busca pelo título de doutor, ou de mestre, e esses fatores são classificados em internos e externos. Motivação, autoestima e confiança são exemplos de fatores internos. Dentre os fatores externos, é possível citar: vida pessoal, financiamento da pesquisa, estrutura do departamento, além, claro, da supervisão/orientação.

De todos os fatores, a supervisão é o mais importante para se alcançar o sucesso almejado pelas instâncias envolvidas: aluno, orientador, programa de pós-graduação e sociedade.

O trabalho de supervisionar o aluno é atribuição do orientador (tipos de orientador). A relação do orientador com o orientando varia de orientação para orientação. Cada aluno possui características particulares que devem ser levadas em consideração durante o progresso da pesquisa. Mas, independente dessas especificidades, podem-se listar algumas atribuições/propriedades de uma boa orientação, tais como:

Dedicação/Disponibilidade: refere-se ao tempo que o orientador dispõe para trabalhar com o estudante. É imprescindível que tenham reuniões regulares, assim, o orientador pode aferir o andamento da pesquisa e o amadurecimento do aluno, e o aluno pode ser aconselhado mais rapidamente. Dicas para o aluno: i) antes da reunião, envie um relatório reportando os avanços alcançados, bem como as limitações/desafios, e, ii) sempre, ao final de uma reunião, envie um email/ata registrando o que foi discutido.

Condução/Opiniões precisas: a pesquisa é uma tarefa mal-definida (ill-posed problem) que pode gerar ansiedade e sensação de estar andando em círculos. Um bom orientador deve ser capaz de i) auxiliar o aluno a desbravar esse ambiente recheado de incertezas, e ii) dar opiniões precisas sobre alternativas para os percalços que sucedem durante a pesquisa. Também é papel do orientador sugerir um redirecionamento da pesquisa caso perceba que uma “rua sem saída” se avizinha. Esse acompanhamento, constante e próximo, tem por objetivo verificar se a tese será finalizada no prazo, além de informar, de maneira clara, caso tenha chegado o momento de interromper a parceria.

Suporte/Relação de apoio: é senso comum que, para orientar, é necessário conhecimento técnico aprofundado na área da pesquisa. Sem tal conhecimento, o orientador fica impossibilitado de guiar o aluno nos meandros da pesquisa. Mas, apenas dominar técnicas e métodos não é suficiente. O bom orientador deve dispor de algumas características pessoais que facilitem sua comunicação com os orientandos. Ele deve inspirar o aluno e ser um entusiasta na pesquisa, além de ser respeitoso e altruísta. Tais características permitem que o aluno sinta-se mais seguro em relação aos desafios da pesquisa e, também, ajudam-no a desenvolver habilidades fundamentais para sua vida profissional.

Mesmo correndo o risco de ser redundante, reforço que é atributo do orientador revisar e avaliar relatórios, artigos e teses de seus orientandos em um prazo viável. Se um artigo, uma proposta de tese ou mesmo uma tese ou dissertação ainda não tem a qualidade necessária para ser submetido aos avaliadores, o orientador tem o dever de comunicar isso ao aluno e, também, de ajudá-lo indicando o que é preciso ser melhorado.

Por outro lado, vale salientar que o aluno deve estar ciente que o orientador possui várias atividades, além da orientação. Assim, o aluno deve escrever seu documento de uma maneira que facilite a vida do orientador e que lhe desperte o desejo de ler aquele documento o quanto antes. Mas, as atribuições dos alunos é assunto para outro post.

É papel do orientador manter a sinergia durante o fluxo de trabalho. Não é papel do aluno provar para o orientador que ele consegue fazer pesquisa sozinho, pois, se assim fosse, o orientador seria desnecessário. A pesquisa deve ser desenvolvida em conjunto, é uma parceria na qual o aluno está sendo treinado para realizar pesquisa de alto nível. Desse modo, a qualidade do processo de supervisão pode ser definida como uma função que mede a interação entre orientador e orientando.

Afinal, orientadores disponíveis, que deem opiniões precisas e que mantenham uma relação profissional saudável, podem ser decisivos na formação da próxima geração de pesquisadores.

Tipos de orientador

O orientador é o responsável por guiar e auxiliar o treinamento em pesquisa de alunos em diversos níveis, e.g., mestrado e doutorado. Essa é uma tarefa desafiadora que deve formar o aluno, facilitar seu entendimento sobre as bases da ciência e gerar conhecimento.

Entretanto, não existe uma fórmula mágica. Cada orientação é única. A relação entre o orientador e o aluno envolve diversos fatores de ambas as partes, tais como: background, desejos, expectativas e motivação. Em razão disso, a orientação é um processo personalizado, ou seja, um orientador se comporta de maneira diferente mesmo entre seus alunos.

São vários os estilos de orientação. Existe orientador que sempre está presente, e o que nunca aparece; tem o orientador experiente, e até, o marinheiro de primeira viagem; tem o orientador inseguro, e também, aquele que sempre tem uma opinião precisa sobre os próximos passos. A lista é vasta…

Tomando como base minha experiência, elenquei alguns tipos de orientador. Está é uma lista particular que não tem a pretensão de ser exaustiva. Mas, pode ajudar a identificar algumas características desejáveis ou não do seu (futuro) orientador, e também, pode servir para que você saiba que não está só.

Fantasma

Esse orientador nunca aparece, logo não faz ideia das questões de pesquisa que o aluno está desbravando. Esse tipo também é conhecido como orientador tartaruga, pois põe os ovos na praia (ou seja, aceita os alunos sob sua tutela) e desaparece. Para alunos autônomos, esse tipo de orientador pode funcionar até o momento em que uma crise se avizinha (e tais momentos desafiadores sempre chegam). Mas, para os alunos que precisam de suporte com certa frequência, é, sem dúvida, um pesadelo, uma angústia.

Superstar

É uma estrela de grande magnitude. Encontros são raros. Uma vantagem é que esse tipo de orientador pode abrir portas no futuro e, também, facilitar a obtenção de recursos para o desenvolvimento da pesquisa. Por outro lado, não é incomum que os alunos sejam compelidos a realizar tarefas de ensino e tarefas administrativas para o orientador, em detrimento de sua pesquisa.

Sufocador

Esse orientador deseja saber, em detalhes, todos os passos dos alunos, dentro e fora do ambiente de pesquisa. É controlador e busca a vida dos alunos nas redes sociais. Vai todos os dias, de manhã e de tarde, verificar se o aluno está no laboratório. Cada reunião, em particular ou em grupo, é um processo inquisitório e exaustivo. Quando chega ao ponto de desprestigiar tudo o que o aluno apresenta, é um tormento.

Clone

Esse tipo de orientador deseja que o aluno seja sua réplica em relação à visão de mundo. Os alunos devem trabalhar para solidificar o que o orientador construiu e, assim, aumentar sua reputação. Um aluno muito “criativo” pode ser “podado”. Nesses casos, é comum verificar que a relação patrão-empregado permanece por muito tempo após a defesa.

Generalista

Esse orientador está disposto a “orientar” alunos em qualquer área do conhecimento; é o sabe-tudo. Qualquer tópico de pesquisa existente ou não nessa galáxia, ou em outra, é assunto do seu interesse. Além do mais, ele se acha o maior especialista no assunto, ou melhor, em qualquer assunto. Rapidamente, o aluno percebe que está órfão no tema escolhido.

Amigão

Esse orientador é, normalmente, presente, mas nunca dá uma crítica contundente. Sempre bonzinho, incapaz de desafiar o aluno, mesmo nas situações em que o aluno não cumpre as obrigações. Muitas vezes se mostra indiferente ao progresso na pesquisa, mas reforça o relacionamento pessoal.


Os orientadores são amálgamas das diferentes personas listadas acima, e de algumas não listadas. Independente do caso, o orientador deve enxergar que o aluno está em processo de treinamento para, em breve, se tornar um colega de profissão. Esse é um relacionamento profissional e, como tal, cada um deve ter seu papel claramente delimitado e seu trabalho respeitado.

k-vizinhos mais próximos: uma análise

O algoritmo k-vizinhos mais próximos (do inglês, k-Nearest Neighbors – kNN) funciona da seguinte forma: dada uma instância de teste xq, o algoritmo encontra os k vizinhos mais próximos de xq no conjunto de treinamento. Em seguida, a classe de xq é dada pela classe que ocorrer com maior frequência entre os k vizinhos.

Na figura acima, são mostrados os cinco vizinhos mais próximos da instância de teste xq. Dessas cinco instâncias, 4 são da classe “+” (vermelha) e 1 da classe “0” (azul). Ao aplicar o kNN, com k=5, a instância xq é classificada como sendo da classe vermelha, pois essa classe possui mais representantes na vizinhança de xq.

Esse algoritmo possui dois parâmetros: o número de vizinhos (k) e a medida de dissimilaridade (ou de similaridade) usada para encontrar os vizinhos mais próximos. A distância Euclidiana é a medida mais amplamente usada para determinar os vizinhos, embora existam diversas opções. Em relação ao parâmetro k (número de vizinhos), várias alternativas para determinar o valor mais adequado por tarefa podem ser empregadas. Uma delas é avaliar o algoritmo kNN no conjunto de validação, adotando diferentes valores para k. O valor de k que alcançar a melhor precisão será escolhido para classificar todas as instâncias de teste.

Uma primeira diferença em relação a outras máquinas de aprendizagem, tais como árvore de decisão e multi-layer perceptron, é que, no kNN, a etapa de treinamento é caracterizada apenas pelo armazenamento das instâncias. A rigor, não há treinamento. Logo, a função que será usada para a tomada de decisão é definida em operação, analisando um subconjunto dos dados de treinamento, i.e., os k vizinhos mais próximos. Por esse motivo, pode-se dizer que o kNN é uma máquina de aprendizagem local.


Embora seja simples, vale destacar que o kNN constrói regiões de decisão não-lineares no espaço de características. Para ilustrar, a figura a seguir mostra como o espaço de características bidimensional é dividido quando emprega-se o kNN, com k=1. As linhas verdes delimitam a área de cobertura de cada uma das instâncias de treinamento (pontos pretos: x1, x2 e x3). Assim, qualquer instância de teste que se posicionar na região amarela será classificada como sendo da mesma classe da instância x1, pois essa será a instância mais próxima. Da mesma forma, instâncias localizadas na região laranja serão classificada pela classe de x2 e, na região azul, pela classe de x3.

Importante destacar que as regiões de cobertura mostradas na figura foram obtidas usando apenas um vizinho mais próximo (1NN). Ou seja, essas regiões podem ficam mais complexas ao adotar valores maiores de k. Além disso, uma caraterísticas interessante do kNN é que as regiões de coberturas podem ser facilmente modificadas ao inserir, remover ou reposicionar as instâncias.


Mas, o kNN possui algumas desvantagens:

Armazenamento: todas as instâncias de treinamento são armazenadas para posterior consulta, quando da chegada de uma instância de teste. Se o conjunto de treinamento possuir muitas instâncias, a quantidade de memória requerida para armazená-lo pode ser um problema. Uma alternativa, para aliviar essa questão, é usar algoritmos de redução de instâncias que têm o intuito de reduzir o número de instâncias no conjunto de treinamento.

Esforço computacional: a função que classificará uma instância de teste, só é definida em operação, usando os vizinhos mais próximos. Logo, o kNN requer um esforço de processamento, em tempo de execução, para vasculhar todo o conjunto de treinamento em busca dos vizinhos para cada instância de teste. Algoritmos de redução de instâncias também podem auxiliar para mitigar essa desvantagem do kNN.

Alta dimensionalidade: ao calcular a dissimilaridade (por exemplo: usando a distância Euclidiana) entre vetores que são representados por muitas variáveis, esse cálculo pode ser impreciso devido à alta dimensionalidade dos vetores. Uma maneira de atenuar essa questão é remover variáveis redundantes ou pouco relevantes, para fins de classificação, usando algoritmos de seleção ou de extração de características.


A figura a seguir mostra dois exemplos que ilustram uma instância de teste e seus cinco vizinhos mais próximos. Nesses dois exemplos, percebe-se que a instância de teste xq está bastante próxima das instâncias da classe “0” (azul). Mas, o kNN (k=5) classificará as duas instâncias de teste como pertencentes à classe “+” (vermelha), pois essa classe possui mais instâncias do que a classe azul na vizinhança de xq.

Nesses exemplos, a proximidade de xq em relação aos seus vizinhos não é levada em consideração. Apenas a quantidade de instâncias na vizinhança é usada para decidir a classe de xq. Mas, é possível encontrar variações do kNN que visam abrandar essa e outras propriedades previamente discutidas.

Redução de instâncias: seleção & geração

Algoritmos de redução de instâncias têm o objetivo de representar um conjunto de dados usando poucas instâncias. Dado um conjunto de dados (T), deseja-se obter um conjunto reduzido (S), de forma que o número de instâncias em S seja menor do que o número de instâncias em T, i.e., |S|<|T|. O novo conjunto S substituirá o conjunto T; logo, S não é qualquer subconjunto de T, mas, um conjunto que mantenha as informações do conjunto original e que o represente.

Esses algoritmos de redução são comumente aplicados na etapa de pré-processamento, antes do treinamento de uma máquina de aprendizagem. Ao diminuir o número de instâncias de um conjunto de dados, a quantidade de memória requerida para armazenar esses dados é reduzida. Além disso, máquinas de aprendizagem podem ser treinadas com maior agilidade, pois precisam extrair informações de uma quantidade menor de instâncias. Em especial, os algoritmos de aprendizagem baseados em instância (instance-based learning), tal como o k-Nearest Neighbors (kNN), podem se beneficiar bastante, visto que esses algoritmos são reconhecidamente lentos em operação.

Algoritmos de redução de instância são categorizados em: seleção de instâncias e geração de protótipos. Na seleção, o conjunto reduzido S é um subconjunto de T. Já na geração, o conjunto S é formado por instâncias que não necessariamente existem em T, ou seja, o algoritmo pode criar novas instâncias.

Seleção de instâncias

Essa abordagem busca pelo melhor subconjunto de instâncias (S) em um conjunto de dados (T), de forma que S ⊂ T. Para realizar tal tarefa, uma função de custo que define o que significa “melhor” subconjunto precisa ser definida. Por exemplo, no algoritmo de seleção de instâncias Edited Nearest Neighbors (ENN), a função de custo tem a tarefa de remover todas as instâncias que não são corretamente classificadas por seus vizinhos mais próximos. Outro exemplo é o Condensed Nearest Neighbors (CNN) que foca em remover instâncias que estão mais próximas dos centros das classes.

As figuras acima mostram os subconjuntos gerados pelos algoritmos ENN e CNN, a partir do conjunto de dados mostrado na primeira figura à esquerda. Pode-se notar que o ENN remove poucas instâncias e que a maioria das instâncias removidas pertence a regiões de borda. Logo, o ENN expõe mais claramente as fronteiras entre as classes.

A função de custo do CNN foca na remoção de áreas seguras, ou seja, agrupamentos de instâncias que têm a mesma classe. Por isso, na figura que mostra o resultado da aplicação do CNN, é possível perceber áreas vazias longe das fronteiras entre as classes. Esse algoritmo representa o conjunto de dados original usando bem menos instâncias do que o ENN.

Geração de protótipos

Os algoritmos de geração de protótipos criam instâncias artificiais que são usadas para representar o conjunto de dados original. Assim, ao invés de selecionar instâncias que existem no conjunto original, como os algoritmos de seleção de instâncias, os algoritmos de geração produzem novas instâncias (protótipos) que não existem no conjunto de dados inicial.

Para ilustrar como um protótipo pode ser criado para representar algumas instâncias, é possível se valer da noção de algoritmos de agrupamento (clustering), mesmo sabendo que esses pertencem a um espectro maior de aplicações. Os algoritmos de agrupamento fornecem um conjunto de grupos, e cada grupo pode ser representado por seu centro. Logo, pensando em reduzir as instâncias, pode-se representar todo o conjunto de dados original usando apenas os centros dos grupos. Assim, o número de protótipos no conjunto reduzido S é definido pela quantidade de grupos gerada pelo algoritmo de agrupamento.

A ideia é criar esses novos protótipos de forma que sejam necessários poucos deles para cobrir o espaço de características. Desta forma, o posicionamento desses protótipos nesse espaço é de suma importância. Muitas vezes, esse posicionamento é definido por um processo de otimização, tal como no algoritmo de classificação supervisionada learning vector quantization que é a pedra angular de diversas técnicas de geração de protótipos.

Discussão: Seleção versus Geração

A maioria das técnicas de seleção de instâncias e de geração de protótipos foi desenvolvida tendo como alvo o algoritmo kNN. Mas, vale destacar que essas técnicas podem ser usadas, eficientemente, como pré-processamento em outras abordagens de aprendizagem.

Para algumas aplicações, não é plausível gerar dados artificiais a partir dos dados originais. Logo, as técnicas de seleção seriam mais indicadas para esses casos. De maneira geral, as técnicas de seleção requerem menos poder computacional do que as de geração. Por outro lado, as técnicas de geração conseguem representar os dados originais de maneira mais concisa e, em geral, obtêm melhor precisão do que as de seleção.

Embora os algoritmos de redução de instâncias sejam rotineiramente usados na etapa de pré-processamento, antes do treinamento de uma máquina de aprendizagem, eles podem ser aplicados em outros cenários. Em [Cruz et al. 2018, Cruz et al. 2017], algoritmos de redução foram aplicados no contexto de combinação de classificadores.

Definição do tema de pesquisa

A escolha do tema é uma etapa desafiadora e deve ser realizada antes do início da pesquisa. A diversidade de possíveis temas é imensa. Porém, independente da escolha, é importante verificar algumas questões que podem indicar se um caminho promissor será trilhado. Seguem algumas perguntas (figura a seguir) que devem ser levadas em consideração para ajudar nessa escolha:

Afinco e dedicação passam a ser palavras de ordem quando se trabalha em algo que se tem interesse, algo que supõe-se promissor. Essa motivação extra, que advém do prazer associado ao desenvolvimento de algo que lhe é importante, contribuí, uma enormidade, para se atingir o objetivo. Escolha um tema do seu interesse ou se interesse por um tema que lhe foi sugerido.

Caso você ainda não tenha conhecimento amplo sobre o tema, você deve estar disposto a amadurecer rápido. Esse amadurecimento será guiado pelo orientador. Ele lhe indicará referências (artigos, livros, teses, entre outras) que, por sua vez, devem ser de fácil acesso.

Outra questão diz respeito aos dados para realizar a pesquisa. Se os dados estiverem disponíveis, um trabalho a menos. Mas, se você tiver que coletar os dados, tenha o cuidado de analisar a viabilidade e, também, o tempo necessário para essa tarefa. Falando em tempo, averigue se o cronograma cabe no tempo que você dispõe para desenvolver a pesquisa.

Ligue o sinal de alerta se você respondeu não para alguma questão acima, pois o trabalho já é árduo quando essas variáveis estão sob controle. Para os que responderam sim, sucesso na pesquisa.

Classificador baseado em perturbação

Após o treinamento de uma máquina de aprendizagem, obtém-se um modelo M que é usado para classificar novas instâncias, ou seja, instâncias nunca vistas durante o processo de treinamento. Esse modelo funciona da seguinte maneira: recebe como entrada uma instância de teste (xq) e fornece como saída uma predição da classe (ωq) dessa instância, i.e., M(xq) → ωq.

Conforme descrito acima, observam-se duas fases: uma de treinamento, na qual o modelo M é gerado, e uma de teste, na qual o modelo é usado para classificar novas instâncias (xq). Mas, existem outras alternativas, por exemplo: no artigo Online local pool generation for dynamic classifier selection, os modelos só são treinados quando a instância de teste é apresentada ao sistema. Assim, os modelos são treinados on-the-fly, especificamente para classificar cada instância de teste e, depois da classificação, os modelos são descartados. Vale destacar que quando o sistema é colocado em execução, ele não possui nenhum classificador armazenado. Esse tipo de abordagem tem a vantagem ser facilmente adaptável à inclusão de novos dados de treinamento, mesmo quando o sistema está implantado no cliente.

Com o intento de unir esses dois mundos, propusemos um novo classificador que parte do processo de treinamento é feito offline e parte é feito online, chamado Perturbation-based Classifier (PerC). A parte offline é igual ao procedimento corriqueiro, descrito acima, no qual o conjunto de dados de treinamento é usado para gerar o modelo. Já o procedimento onlineutiliza a instância de teste (xq), em tempo de execução, para auxiliar no processo de tomada de decisão da máquina de aprendizagem.

Para explicar o funcionamento da parte online, suponha um problema com duas classes (ω1 e ω2)  e admita que a instância de teste xq pertence à classe ω1. Assim, é esperado que a inserção da instância xna classe ω1 causará uma “perturbação” (daí o nome do classificador) menor do que sua inserção na classe ω2, pois xq pertence à classe ω1. Essa é a hipótese.

perc

Para ilustrar o conceito de perturbação, a figura acima mostra uma tarefa simples composta de duas classes (ω1: azul e ω2: vermelha), na qual deseja-se classificar a instância de teste xq (representada pelo triângulo verde). Para cada uma das classes, é possível calcular seu centroide (centro de massa), representado por um quadrado preenchido da cor da classe.

O algortimo PerC adiciona xq ao conjunto de treinamento das classes, admitindo, momentaneamente, que tal instância pertence a cada uma das possíveis classes do problema. Assim, suponha que xq pertence à classe azul. Logo, o número de instâncias nessa classe será acrescido de um e, feito isso, recalcule seu centro de massa. Faça o mesmo para a classe vermelha: suponha que xé uma instância vermelha e recalcule o centro de massa dessa classe. Os novos centros de massa são representados por quadrados vazados da cor de cada classe.

Depois do recálculo dos centros de massa, podemos verificar qual centro de massa sofreu maior variação em seu posicionamento original no espaço de características. O centro de massa da classe azul sofreu uma menor variação quando comparado ao centro de massa da classe vermelha. Logo, o PerC classificará xcomo sendo da classe azul (ω1). Vale enfatizar que ao inserir xna classe azul, o comportamento dessa classe mudou pouco, dando a entender que a instância adicionada já fazia parte da distribuição dessa classe. Observando a figura, notam-se que os quadrados preenchidos são calculados offline, enquanto os quadrados vazados só foram calculados online, usando a instância de teste (xq).

Para tarefas com mais de duas classes, ou seja, multi-classe, o PerC funciona da mesma forma. Ele adiciona, temporariamente, a instância de teste xq, em cada uma das classes, e avalia a perturbação causada. A classe que for minimamente perturbada é atribuída como sendo a classe da instância xq. Para fins de ilustração, nesse exemplo foi usada a média da classe como fator fundamental para a análise da perturbação. Mas, outros fatores podem ser levados em conta, tal como a matriz de covariância das classes.

PerC não pode ser categorizado como um sistema de online learning, pois a instância de consulta xq não é permanentemente adicionada ao conjunto de treinamento. No PerC, após a classificação, a instância xé descartada. De maneira geral, PerC não pode ser enquadrado em nenhum paradigma de aprendizagem existente. É um novo paradigma.

O código-fonte do PerC pode ser acessado em https://github.com/rjos/perc.

Processamento de linguagem natural: representando palavras

Os avanços científicos e tecnológicos em processamento de linguagem natural têm o objetivo de intermediar a comunicação entre computadores e humanos usando seu principal meio de transmissão de informação, de conhecimento e de sentimento: a linguagem natural. A comunicação entre humanos é uma relação social bastante complexa que envolve o uso de diversos recursos, tais como: gestos e símbolos. Mas, dentre todos os meios, a palavra merece uma atenção especial, por sua abrangência e alcance.

A confluência entre palavras e sistemas de aprendizagem de máquina mostra um caminho para a produção de aplicações que agregam valor a diversas tarefas: tradução, detecção de fake news, deteção de hate speech, categorização de documentos, análise de sentimentos e de emoções, entre outras. Um pilar fundamental para o sucesso da automatização de tais aplicações reside na representação dessas palavras de uma forma que facilite a tarefa das máquinas de aprendizagem. Essa tal representação deve preservar o significado das palavras.

WordNet é um dicionário de sinônimos de palavras em inglês. Além dos sinônimos, o WordNet armazena, para cada palavra, um conjunto de relações do tipo “é um”. Por exemplo: para a palavra morcego, as relações “é um” animal, “é um” mamífero, entre outras, podem ser recuperadas. Assim, o WordNet é uma alternativa para representar palavras, porém, possui algumas limitações. Uma delas refere-se a incompletude, ou seja, faltam sinônimos de várias palavras, especialmente, de palavras mais novas. Ao se analisar textos, algumas palavras aparecem regularmente próximas entre si, enquanto outras, raramente, aparecem juntas. Para exemplificar: as palavras “tubarão” e “baleia” ocorrem juntas com mais frequência do que as palavras “tubarão” e “deserto”. Logo, uma informação importante diz respeito à similaridade entre palavras, e isso, o WordNet também não oferece.  

One-hot encoding

Até 2012, boa parte das aplicações representavam palavras usando uma codificação ortogonal. Para ilustrar, um corpus composto por seis palavras: tubarão, baleia, deserto, golfinho, mamífero e peixe, seria representado pelos vetores binários:

one-hot-enconding

Essa forma de representar, também conhecida como one-hot encoding, traz consigo algumas questões. Em geral, um corpus (conjunto de textos) possui mais do que seis palavras. Dado que o tamanho do vetor, que representa cada palavra, é igual ao número de palavras no corpus, esse vetor terá, facilmente, o tamanho de algumas centenas de milhares de posições. Logo, são vetores grandes e esparsos (cada vetor possui apenas um valor “1” e vários “0”s). 

Outro fator negativo ao empregar o one-hot encoding está relacionado à similaridade entre as palavras. Nessa representação, a distância entre quaisquer duas palavras é a mesma, pois cada palavra é um vetor perpendicular a todos os outros, logo, o produto interno entre dois vetores é igual a zero. Desta forma, a distância entre as palavras “baleia” e “golfinho” e as palavras “baleia” e “deserto” é a mesma. Nenhuma relação entre as palavras é estabelecida, e isso fere o objetivo de adicionar semântica ao processo, pois sabemos que as palavras “baleia” e “golfinho” aparecem mais frequentemente juntas do que as palavras “baleia” e “deserto”.

Word vectors

Tendo em vista que a relação entre as palavras é importante, pois é uma forma de adicionar semântica ao processo, alternativas foram desenvolvidas para incluir essa informação de contexto no vetor que representada cada palavra. Desde 2013, uma forma de mapear palavras em vetores com valores reais, estabeleceu-se como o estado da arte da área: word vectors (word embedding).

Ao contrário do one-hot enconding, no qual um vetor perpendicular às demais palavras é atribuído a cada palavra, os word vectors são aprendidos usando uma rede neural artificial. Esse processo de aprendizagem dos vetores leva em consideração o fato de que palavras que ocorrem em contextos similares possuem semânticas, também, similares. Dito de outra forma, se a palavra “peixe” aparece próxima da palavra “tubarão” mais frequentemente do que a palavra “mamífero”, é esperado que as palavras “peixe” e “tubarão” sejam mais “parecidas”, semanticamente, do que as palavras “peixe” e “mamífero”. Assim, deseja-se construir vetores que representem as palavras de forma que a distância entre “peixe” e “tubarão” seja menor do que a distância entre “peixe” e “mamífero”.

A figura a seguir mostra exemplos de word vectors nos quais é possível observar que as distâncias entre as palavras não é a mesma e que algumas relações semânticas, semelhantes às descritas no parágrafo anterior, são preservadas. Nota: cada uma das palavras dessa figura era formada originalmente por um vetor de cem valores e, para fins de visualização, a dimensionalidade foi reduzido para duas usando a análise dos componentes principais. Logo, muita informação foi perdida nesse processo de redução para uma representação 2D.

pca-word2vec

Mas, como embutir tal semântica nos vetores que representam as palavras, sabendo que tais vetores são compostos por números reais? Para ilustrar a intuição dessa construção dos vetores, veja o exemplo a seguir que mostra a frase “Focas, orcas, golfinhos e baleias são mamíferos que vivem nos mares”. Nesse exemplo, o elemento “central” é dado pela palavra “baleia” e os elementos de “contexto” estão destacados em verde.  Esse processo é chamado de janelamento e, para essa ilustração, foi usado uma janela de tamanho cinco. De maneira iterativa, essa janela percorre a frase, colocando outras palavras como o elemento “central”.

word2vec-frase2

Os valores que compõem o vetor da palavra “central” são atualizados de maneira que consigam predizer quais palavras formam o “contexto”. Na figura, wt representa a palavra central “baleia” e P(wt+2|wt) é a probabilidade de predizer a palavra  “mamífero” (wt+2) dada a palavra “baleia” (wt). Desta forma, ao apresentar várias e várias janelas à máquina de aprendizagem, o modelo consegue aprender o contexto de palavras estimando a probabilidade de uma palavra no “contexto” ser predita pela palavra “central”. E, ao fim, esse processo “magicamente” embute o significado das palavras nos valores dos vetores.  Para mais detalhes sobre o funcionamento do modelo, veja o artigo que propõe o Word2vec. Esse é o modelo seminal que usa uma rede neural para representar as palavras seguindo a intuição descrita acima.

Etapas de um sistema de múltiplos classificadores

Um sistema de múltiplos classificadores (multiple classifier system — MCS) é composto por um pipeline de três etapas: geração, seleção e integração — conforme mostrado na figura a seguir.

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Etapas de um sistema de múltiplos classificadores. [adaptada de Cruz et al. 2018]
Pode-se observar essas três etapas de um MCS como uma caixa-preta que recebe como entrada um conjunto de treinamento (Γ), um conjunto validação e uma instância de teste (xq), e que fornece como saída, a classe (no caso de classificação) ou o valor predito (no caso de regressão ou previsão de séries temporais) da instância de teste. Da mesma forma que máquinas de aprendizagem monolíticas (árvore e decisão, redes neurais, entre outras), um MCS busca uma função capaz de predizer com eficácia o rótulo das instâncias que lhe são apresentadas durante a generalização. A seguir, são descritas as três etapas de um MCS.


Geração

Na primeira etapa, geração, as máquinas de aprendizagem são treinadas e armazenadas em um pool que pode ser homogêneo ou heterogêneo. Por homogêneo, entende-se que todos os modelos do pool são treinados usando o mesmo algoritmo de aprendizagem, e.g., árvore de decisão. Por outro lado, em um pool heterogêneo, os modelos são treinados com diferentes algoritmos, tais como: árvore de decisão, perceptron e redes neurais.

Usar algoritmos diferentes é uma forma de aumentar a diversidade do pool; sendo essa uma vantagem de um pool heterogêneo. Porém, escolher quais algoritmos de aprendizagem devem ser usados, e quantos, é um problema desafiador. Daí, gerar um pool homogêneo é uma alternativa interessante por sua simplicidade.

Mesmo trabalhando com um pool homogêneo, é necessário que os modelos desse pool sejam diversos. Bagging (bootstrap aggregating) é um algoritmo comumente usado para esse fim e funciona da seguinte forma: dado um banco de dados de treinamento (Γ) com n instâncias, bagging gera m bancos de dados usando reamostragem com reposição. Cada banco de dados gerado tem o mesmo número de instâncias (n) do banco de dados original. Mas, como bagging é um procedimento com reposição, cada banco de dados terá instâncias repetidas. É esperado que 63,2% sejam instâncias únicas de Γ, e que, o restante, 36,8%, seja composto de instâncias repetidas. Cada um dos bancos de dados gerado por bagging é usado para treinar um modelo. Assim, ao fim do processo, m modelos são treinados, C = {c1, c2, …, cm}.

Dado que bagging usa um processo aleatório para adicionar instâncias a cada um dos bancos, pode-se afirmar, com alta probabilidade, que os bancos gerados são diferentes entre si. Diferença essa que auxilia na geração de modelos diversos. Além do bagging, outros algoritmos são usados para gerar o pool, entre eles: boostingrandom subspace rotation forest.


Seleção

Após a geração, a próxima etapa tem o objetivo de selecionar um subconjunto de modelos do pool que será usado para predizer a classe/valor da instância de teste. A seleção pode se dar de duas formas: estática ou dinâmica.

ss
Seleçao estática [adaptada de Cruz et al. 2018]
A seleção estática (static selection – SS) escolhe os melhores modelos do pool C que comporão o ensemble de modelos C’, sendo C’ ⊂ C. A figura acima mostra que esse processo é realizado offline, ou seja, durante o treinamento, e usa o conjunto de validação como guia para a escolha dos modelos. Na seleção estática, o mesmo subconjunto de modelos C’ é usado para classificar/predizer todas as instâncias de teste (xq).

Já na seleção dinâmica, os modelos selecionados podem diferir de uma instância de teste para outra; por esse motivo é chamada de dinâmica. Essa operação de seleção é realizada online, quando o sistema completo já está em operação, e depende da instância de teste que se deseja avaliar.

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Seleção dinâmica de um modelo (ci) por instância de teste (xq) [adaptada de Cruz et al. 2018]
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Seleção dinâmica de um ensemble (C’) por instância de teste (xq) [adaptada de Cruz et al. 2018]
As duas figuras acima mostram formas de selecionar dinamicamente modelos: a primeira seleciona apenas um modelo por instância de teste, enquanto a segunda seleciona um ensemble, um subconjunto do pool inicial.

A seleção dinâmica é motivada pelo fato de que nem todos os modelos no pool são competentes para predizer o rótulo de todas as instâncias de teste. Assim, deseja-se encontrar, por instância, os melhores especialistas (modelos) para realizar essa predição.


Integração

A etapa de seleção pode escolher um ou mais modelos. Se apenas um modelo for selecionado, não há integração. Nesse caso, a resposta do sistema é dada pela aplicação do modelo selecionado à instância de teste, i.e., ci(xq).

Sob outra perspectiva, se mais de um modelo for selecionado, é necessário o emprego de alguma regra para combinar as respostas dos modelos. Essas regras podem ser divididas em duas categorias: treináveis e não-treináveis. As não-treináveis levam esse nome pois são regras fixas que não necessitam de um processo de treinamento. Nessa categoria, o voto majoritário é a regra mais empregada. Nesta regra, cada modelo vota em uma classe e a classe com mais votos é atribuída como sendo o rótulo da instância de teste. Outros exemplos de regras não-treináveis são: média, produto, soma, mínimo e máximo.

Como o próprio nome indica, as regras treináveis são definidas por um processo de treinamento. Assim, usam-se máquinas de aprendizagem com o propósito de aprender a melhor função que integrará as respostas dos modelos selecionados. Qualquer máquina de aprendizagem pode ser usada para esse fim, e.g., árvore de decisão e multi-layer perceptrons.

Quando não se sabe a priori quantos modelos serão escolhidos pela etapa de seleção, as regras não-treináveis são mais usadas do que as treináveis, pois a maioria das máquinas de aprendizagem requerem um vetor de características de tamanho fixo. Além disso, as regras não-treináveis são mais simples e, por conseguinte, mais fáceis de interpretar.

Combinação de classificadores: uma introdução

Ao treinar uma máquina de aprendizagem, muitos desafios espreitam o horizonte, entre eles: overfitting. Uma das alternativas para minimizar overfitting é escolher a máquina correta para a tarefa que se deseja resolver. Por exemplo: se tivermos poucos dados disponíveis, uma rede neural artificial pode não ser a melhor escolha; embora existam estratégias para gerar dados artificiais e aumentar a quantidade de dados de treinamento, tais como oversampling data augmentation. Uma escolha mais apropriada seria um algoritmo de instante-based learning, e.g., k-nearest neighbor. 

Escolher o melhor algoritmo de aprendizagem, por tarefa, é uma problema em busca de solução. Muitas abordagens que se valem de meta-learning já foram propostas, mas ainda existe muito terreno a percorrer nesse campo. Essa é uma pesquisa bem interessante e motivada, também, por um teorema de nome engraçado, mas, extremamente importante para a área, chamado de no free lunch theorem. Esse teorema nos indica que não existe uma máquina de aprendizagem que seja a melhor para todas as tarefas. Ou seja, cada tarefa tem suas peculiaridades que devem ser melhor resolvidas por máquinas que tenham características distintas. Nota: um teorema é uma afirmação provada como verdadeira; logo, essa difere de uma mera opinião.

Consequentemente, é responsabilidade do especialista em aprendizagem a escolha da melhor máquina para resolver uma nova tarefa. Mas, existe outra alternativa…

Se para cada tarefa, uma máquina deve ser escolhida, por que não unir esforços e juntar várias máquinas para resolver essa tal tarefa? Vox Populi, Vox Dei. vox-populi-vox-dei3Esse “poder das multidões” (wisdom of the crowd) é a premissa da área de Combinação de Classificadores (ensemble learning) que possui vários nomes, tais como: sistemas de múltiplos classificadores e máquinas de comitê. Esses sistemas combinam máquinas com o intuito de melhorar a precisão geral do sistema, fundamentando-se no argumento de que a junção das opiniões de um grupo de indivíduos é melhor do que a opinião de apenas um indivíduo.

Em um experimento, no início do século vinte, Sir Francis Galton — o mesmo que desenvolveu um método eficiente para classificação de impressões digitais — combinou a resposta de 787 pessoas que estimaram o peso de um boi morto e vestido. Ao calcular a média das respostas de todos os participantes, Galton observou que o erro foi menor do que um porcento (link). Ao invés de combinar as respostas de todos, Galton poderia ter escolhido o indivíduo mais competente para estimar o peso. Entretanto, essa escolha não seria uma tarefa trivial, da mesma forma que, escolher a melhor máquina de aprendizagem, por tarefa, não é uma tarefa simples. Assim, ao combinar todas as respostas, a probabilidade de escolher um indivíduo incompetente foi minimizada.

É inútil combinar máquinas que tenham o mesmo comportamento, ou seja, máquinas que acertem e errem as mesmas instâncias. Assim, ao juntar várias máquinas em um pool, é esperado que elas tenham um excelente desempenho em partes diferentes do espaço de características. Em outras palavras, é fundamental que as máquinas sejam diversas entre si. Existem várias maneiras de se obter diversidade, entre elas: usar diferentes algoritmos de aprendizagem e usar dados diferentes para treinar cada uma das máquinas.

Razões para combinar máquinas

Os aspectos que fortalecem o uso de estratégias de combinação de classificadores podem ser aglutinados em: estatístico, computacional e representacional. A figura ao lado é usada para explicar esses três aspectos. reasons-mcsNela, vê-se que o “espaço dos bons modelos”, para uma dada tarefa, é um subconjunto do “espaço dos modelos”. Esses modelos são máquinas de aprendizagem, de classificação ou de regressão, que foram treinadas com dados de uma tarefa específica. Além disso, o asteriscos (∗) representa o classificar ideal, os círculos (•) são os classificadores individuais e o triângulo (Δ) representa a combinação dos classificadores (ensemble). Objetiva-se obter um modelo o mais próximo possível do modelo ideal (∗). Nota: essa figura foi adaptada da figura 3.2 do livro da Kuncheva, 2014.

Estatístico

Na figura que mostra o aspecto Estatístico, percebe-se que o modelo combinado (Δ) está bem mais próximo do modelo ideal (∗) do que a maioria dos modelos individuais (•). Vale salientar que o modelo combinado não é o melhor, pois existe pelo menos um modelo (•) que está mais próximo do modelo ideal do que o modelo combinado. Entretanto, por melhor que seja o seu procedimento experimental, a incerteza relacionada à precisão do modelo, aferida durante o treinamento, pode levar a escolha de um modelo inadequado. Assim, ao combinar os modelos, minimiza-se a chance de selecionar um modelo ruim.

Computacional

Durante o treinamento, um modelo é levado do “espaço dos modelos” para o “espaço dos bons modelos” — conforme mostrado pelas curvas em cinza na figura do aspecto Computacional.  Cada um desses modelos (•) deve se posicionar em um mínimo local diferente da superfície de erro. Logo, a combinação desses modelos diversos gerará um modelo mais próximo do modelo ideal.

Representacional

Suponha que todos os modelos individuais (•) sejam lineares e que a tarefa, que se deseja resolver, seja não-linearmente separável. Logo, nenhum modelo, cuja representação é linear, será capaz de modelar essa tarefa. Por outro lado, ao combinar modelos lineares, regiões não-lineares podem ser modeladas. Assim, na figura que mostra o aspecto Representacional, percebe-se que o modelo combinado (Δ) está fora do “espaço dos modelos”, pois todos os modelo desse espaço são lineares e o alvo é um modelo não-linear que pode ser alcançado combinando modelos lineares. De maneira geral, regiões complexas de bordas entre classes podem ser modeladas usando modelos simples.

No próximo post, arquiteturas de combinação de classificadores — estática e dinâmica — serão discutidas.

Como evitar overfitting?

Não existe uma bala-de-prata para evitar overfitting. Boas práticas na condução de procedimentos experimentais, aliado ao entendimento do significado desse fenômeno, 99-ou-overfitting
contribuem para amenizar esse indesejável problema. Seguem alguns pontos a considerar para combater o overfitting.

treinar com mais dados

Se a máquina de aprendizagem usada é complexa, em termos da quantidade de parâmetros a ajustar, uma alternativa é adquirir mais dados com o intuito de equilibrar a quantidade de parâmetros versus a quantidade de instâncias de treinamento. Ou, simplesmente, deve-se escolher uma máquina mais simples, que tenha menos parâmetros.

validação cruzada

Uma das formas de realizar validação cruzada é usar o procedimento k-fold cross-validation. Nesse procedimento, o conjunto de dados é dividido em k partes, aproximadamente do mesmo tamanho, das quais, k-1 partes são usadas para treinar o modelo e a parte restante é usada para avaliar o modelo. Esse processo é repetido k vezes, de forma que cada parte será usada tanto para treinar como para avaliar o modelo. De maneira geral, a validação cruzada, por si só, não evita overfitting, mas segue uma boa prática ao separar o conjunto de teste e ao realizar um revezamento dos dados para uma melhor avaliação, no que tange a generalização do modelo em instâncias não vistas. Uma observação: o k-fold cross-validation não é uma boa opção quando o conjunto possui poucos dados.

parar o treinamento mais cedo (early stopping)

Máquinas de aprendizagem, tais como redes neurais artificiais, árvores de decisão, deep learning, entre outras, aprendem iterativamente. A cada passo, a máquina ajusta seus parâmetros aos dados e isso pode ser monitorado. Pode-se usar esse monitoramento para decidir qual é o melhor momento de interromper o treinamento da máquina. Espera-se que a precisão no conjunto de treinamento aumente com o tempo, mas, em relação ao conjunto de validação, a acurácia deve atingir um pico e depois cair. Esse pode ser um bom momento para frear o treinamento, antes que a máquina se sobreajuste aos dados.

regularização

Regularização é um conceito amplo que envolve várias técnicas com o propósito de produzir modelos que melhor se ajustem aos dados, evitando overfitting. Um exemplo é o procedimento de poda em uma árvore de decisão. Esse consiste em eliminar alguns “galhos” que, uma vez removidos, reduzirá a árvore, tornando-a mais simples e menos específica às instâncias de treinamento. Outros exemplos de técnicas de regularização envolvem dropout em redes neurais e adição de parâmetros de penalização na função de custo.

ensemble

Ensemble learning, ou sistema de múltiplos classificadores – SMC -,  combina as saídas de vários modelos com o intuito de melhorar a resposta final do sistema. Os SMCs têm alcançado resultados melhores do que o uso de modelos isolados. Esse sucesso deve-se a divisão de tarefas que é o espírito dessa área. Baseado no princípio de dividir-para-conquistar, cada modelo que compõe o SMC é treinado com parte do conjunto de treinamento e, consequentemente, acaba por se tornar um especialista nessa porção. Essa estratégia ajuda a amenizar o overfitting, e além disso, é robusta à presença de ruído nos dados.

 

Overfitting: desafio capital para aprendizagem de máquina

Overfitting (sobreajuste ou superajuste) é, provavelmente, o maior problema em aprendizagem de máquina. Ele ocorre quando um modelo não é capaz de generalizar. Ou seja, o modelo classifica corretamente os dados que foram usados para treiná-lo, mas, não consegue reproduzir esse desempenho em dados novos, que lhe são apresentados durante seu uso em produção. Logo, assume-se que o modelo “decorou” os dados usados para treiná-lo e, por conseguinte, seu desempenho nos dados de treinamento é bastante superior ao seu desempenho em uso, frustrando as expectativas do cliente. 

Para ilustrar, suponha que o treinamento de uma máquina de aprendizagem, usando um conjunto de treinamento Τ, gerou um modelo, e que, esse modelo foi avaliado no conjunto de teste Δ. As taxas de acerto do modelo, nos conjuntos Τ e Δ, foram de 95 e 92%, respectivamente. Logo, a expectativa é que, em uso, a acurácia do modelo gire em torno dos noventa porcento. Mas, ao ser colocado em produção, esse modelo não ultrapassa os 70% de acerto. Essa perda de 20 pontos percentuais, pode ser oriunda de várias fontes, uma delas é overfitting. Mas, o que ocorreu?

Vamos usar um exemplo para explicar o ocorrido. A figura acima mostra três cenários que diferem na função aprendida (modelo que é mostrado em verde) a partir dos dados de treinamento. Veja que na figura (a), o modelo classifica incorretamente muitas instâncias. Já na figura (b), o modelo não erra nenhuma instância, a separação é perfeita. A diferença entre as figuras (a) e (b) está no ajuste dos modelos. Enquanto o modelo da figura (a) não conseguiu aprender a estrutura dos dados (underfitting), o modelo da figura (b) fez uma estimativa muito precisa e acabou por “decorar” as instâncias de treinamento (overfitting). Um caso desejado é apresentado na figura (c), na qual, o modelo se ajusta aos dados, mas de forma a capturar as estruturas das classes e, consequentemente, poder generalizar bem instâncias nunca vistas.

Em outras palavras, caso um modelo bastante simples seja usado, pode-se subestimar e não capturar a complexidade dos dados. Observe que, na figura (a), a região de decisão é não-linearmente separável, logo, uma reta não é capaz de resolver o problema. Por outro lado, ao usar uma função muito complexa (popularmente: um canhão para matar uma mosca), corre-se o risco de decorar as instâncias de treinamento (figura (b)) e, dessa forma, perde-se a capacidade de classificar corretamente instâncias não usadas no treinamento. Vale salientar que a maioria das instâncias que serão incorretamente classificadas concentram-se na borda, perto da região de decisão, entre as classes. Já as instâncias mais internas às classes, essas são facilmente classificadas por qualquer algoritmo (mas, essa é uma discussão para outro post).

Avaliações incorretas geram modelo com overfitting 

A maneira mais comum de se incorrer em overfitting é treinar e avaliar a máquina usando o mesmo conjunto de dados. Suponha a situação na qual o professor passa listas de exercícios durante o curso e, na prova, repete questões dessas listas. Nesse caso, é esperado que os alunos que aprenderam as questões das listas, não terão nenhuma dificuldade em acertar todas as questões da prova. Dessa forma, as notas não refletirão a capacidade dos alunos em resolver problemas semelhantes aos que foram apresentados nas listas de exercícios; pois, os alunos devem ser avaliados em questões diferentes das usadas nas listas de exercícios. Com base nessa analogia, as máquinas devem ser avaliadas usando dados diferentes dos dados que foram usados para treiná-las.

treino-teste

Mesmo quando são usados dois conjuntos disjuntos, um para treinar a máquina e outro para testá-la, não há garantia de que o overfitting será evitado. Isso ocorre quando procedimentos metodológicos incorretos são empregados, tais como: uso de informações dos dados de teste e overfitting no conjunto de validação. 

Usando informações do conjunto de teste

Aprendizagem de máquina é a arte de ajustar parâmetros. São muitos parâmetros para avaliar e uma pergunta recorrente é: quais parâmetros devo usar e em quais circunstâncias? Uma forma comum de abordar essa questão é usar o seguinte procedimento: primeiro, define-se um conjunto de parâmetros, depois, a máquina é treinada e, por fim, o modelo gerado é avaliado no conjunto de teste. Até aí, tudo bem! Mas, se esse processo for repetido com um conjunto diferente de parâmetros, teremos, ao final, dois modelos, cada um treinado com parâmetros diferentes. Como escolher o melhor deles? Se escolhermos olhando para o resultado dos modelos no conjunto de teste, essa escolha está fadada a overfitting, pois, o conjunto de teste foi usado no processo de escolha dos parâmetros. Existem variações desse procedimento incorreto que, por princípio, ferem a premissa de não usar o conjunto de teste no processo de ajuste/escolha do modelo.

Overfitting no conjunto de validação 

Modificando um pouco o procedimento descrito acima, ao invés de se ter dois conjuntos, dividimos os dados em três conjuntos disjuntos: treinamento, validação e teste. O objetivo do conjunto de validação é auxiliar o treinamento da máquina, buscando os melhores parâmetros, similar ao procedimento acima, mas, deixando o conjunto de teste fora do processo. Esse parece ser um procedimento mais confiável, pois, o conjunto de teste, no qual o modelo será avaliado, está, de fato, ausente do processo de treinamento. Perceba que o procedimento de ajuste dos parâmetros pode se repetir diversas vezes, mas o conjunto de validação é o mesmo. Assim, após várias tentativas, um conjunto de parâmetros que satisfaça a métrica usada será encontrado, porém, esse modelo estará sobreajustado ao conjunto de validação. 

Etapas de um sistema de aprendizagem de máquina

O desenvolvimento de sistemas, que usam algoritmos de aprendizagem de máquina, segue um fluxo diferente das abordagens tradicionais. A fonte dessa diferença reside na premissa básica de qualquer algoritmo de aprendizagem: extração de conhecimento a partir de dados históricos.  Assim, são descritas a seguir, cinco etapas para a construção de soluções que baseiam-se em aprendizagem de máquina.

etapa-1

Dado que os algoritmos de aprendizagem de máquina “aprendem” a partir de dados, a primeira etapa é a aquisição dos dados. O conjunto de informações coletadas pode ser armazenado de várias maneiras: sistema gerenciador de banco de dados, planilhas, ou mesmo em arquivo texto. Importante ressaltar que esses dados serão usados para treinar/calibrar o modelo (a máquina de aprendizagem), logo, devem representar toda a diversidade da tarefa sob investigação. Em outras palavras, não conjecture que o sistema irá classificar um pássaro como sendo beija-flor-tesoura, nome científico eupetomena macroura, se nenhum beija-flor dessa espécie está presente nos dados.

etapa-2

Os dados coletados na etapa anterior devem ser tratados com o intuito de prepará-los para o processo de treinamento do algoritmo de aprendizagem. Alguns procedimentos comuns são: seleção de variáveis, redução de instâncias, extração de características, imputação de dados faltantes e análise de outliers. Vale salientar que esse processamento, muitas vezes, está atrelado ao algoritmo de aprendizagem que será usado na etapa seguinte. Isso se dá, pois, algoritmos diferentes, possuem requisitos diferentes. Por exemplo: alguns algoritmos lidam apenas com dados que estejam representados com valores numéricos, outros apenas com valores categóricos. Logo, é necessário converter variáveis categóricas em numéricas, ou vice-versa, dependendo do algoritmo.

etapa-3

Nessa etapa, o algoritmo de aprendizagem de máquina, que melhor adere aos dados, é escolhido para treinar o modelo. Essa escolha deve levar em consideração vários pontos, entre eles: quantidade de instâncias e de variáveis no banco de dados e existência de desbalanceamento entre as classes. Além disso, deve-se atentar ao tipo de aprendizagem: supervisionado, não-supervisionada, semi-supervisionada ou por reforço. E, no caso de ser supervisionado, se o problema é de classificação ou de regressão. Dentre os modelos mais comumente usados, é possível citar: árvore de decisão, redes neurais multi-layer perceptronrandom forest, support vector machines, k-nearest neighbours, XGBoost, logistic regression, k-means, naive bayes, apriori e expectation-maximization. Por fim, vale destacar os sistemas de múltiplos classificadores (ensemble learning) que, ao invés de usar apenas uma máquina, combinam várias máquina de aprendizagem, a fim de melhorar a precisão final do sistema. 

etapa-4

O modelo treinado deve ser avaliado para que seja possível predizer sua precisão em uso. Várias medidas podem ser usadas para aferir a performance do modelo e, a escolha da medida depende da tarefa que se deseja resolver. Exemplos de medidas: acurácia, f-score e curva ROC. Vale ainda frisar que o modelo deve ser avaliado com dados diferentes dos que foram usados para treiná-lo. Assim, os dados devem ser divididos em dois conjuntos disjuntos: treinamento (usada para treinar o modelo) e teste (usado para avaliar o modelo). Quando a estimative de desempenho de um modelo, em dados nunca vistos (dados de teste), é otimista, diz-se que ocorreu overfitting. Esse é, provavelmente, o maior problema de aprendizagem de máquina.

etapa-5

Após a avaliação do modelo, caso o desempenho esperado não tenha sido alcançado, faz-se necessário aperfeiçoar o modelo. As possíveis causas dessa inadequação devem ser investigadas e, caso necessário, retorna-se para a aquisição de novos dados (etapa 1), para o processamento dos dados de um forma diferente (etapa 2) e/ou para o treinamento de um novo modelo, possivelmente, usando um algoritmo de aprendizagem diferente (etapa 3).

Aprendizagem em conjuntos de dados com classes desbalanceadas

Um dos pontos que devemos atentar ao treinar uma máquina de aprendizagem é o desbalanceamento entre as classes. Podemos dizer que as classes estão desbalanceadas quando o número de padrões em uma classe é muito menor do que o número de padrões numa classe diferente.

Veja o exemplo na figura acima que mostra duas classes: azul e vermelha. Nesse conjunto, temos 100 padrões da classe azul e 10 da classe vermelha. Logo, a quantidade de padrões na classe azul é 10 vezes maior do que a quantidade de padrões na classe vermelha. O imbalance ratio (IR) é usado para medir esse desbalanceamento, e é calculado como sendo a razão entre o número de padrões na classe majoritária e o número de padrões na classe minoritária. Para esse exemplo, o IR é igual a 10, pois temos uma razão de um para dez (1:10).

Em muitos problemas do mundo real, esse desbalanceamento é bem mais acentuado. Vamos supor um cenário no qual a razão fosse de 1:1000, ou seja, para cada padrão da classe vermelha, temos mil padrões da classe azul. Nesse cenário, caso uma máquina de aprendizagem sempre respondesse “classe azul”, para qualquer padrão fornecido como entrada, essa máquina atingiria uma acurácia (número de acertos dividido pelo número total de padrões avaliados) próxima a cem porcento. Para ser mais preciso, supondo um conjunto com 3003 padrões, sendo 3 da classe vermelha e 3000 da classe azul (para manter a proporção de 1 para 1000), a acurácia seria de 3000/3003, ou seja, 99,9001% de acerto.

Embora essa taxa de acerto, superior a 99,9%, seja bastante promissora, vale salientar que essa máquina de aprendizagem, de fato, não “aprendeu” nada. Ela, de certa forma, foi guiada a minimizar o erro no conjunto de treinamento (com ampla maioria de padrões da classe azul) e, nesse caso, o treinamento pode tê-la levado a desprezar os padrões da classe vermelha.

No exemplo acima, uma máquina conseguiu quase cem porcento de acerto, mesmo sem aprender a tarefa de maneira relevante. Para esses casos, a acurácia não é uma medida interessante, pois é uma medida global, calculada sem fazer distinção entre as classes. Quando avaliamos conjuntos de dados desbalanceados, devemos utilizar medidas que avaliem as classes separadamente, por exemplo: f-score, g-mean e area under the ROC curve.

É fato que várias máquinas de aprendizado podem, de maneira enviesada, priorizar a classe majoritária durante o seu treinamento. Assim, as principais alternativas para lidar com conjuntos de dados, nos quais as classes estejam desbalanceadas são:

  • pré-processamento: o objetivo é deixar todas as classes com um número similar de padrões, ou seja, balancear as classes. Técnicas de undersampling (remover padrões da classe majoritária) e/ou de oversampling (adicionar padrões na classe minoritária) são empregadas;
  • algoritmo com penalização: os algoritmos de aprendizagem são modificados com o intuito de torná-los sensíveis à questão do desbalanceamento. Assim, durante o processo de treinamento da máquina, o custo ao errar um padrão da classe minoritária é bem maior do que o custo associado a um erro na classe majoritária;
  • ensemble: nessa abordagem, técnicas de pré-processamento são usadas em conjunto com sistemas de múltiplos classificadores. Desta forma, ao invés de centralizar o conhecimento em apenas uma máquina de aprendizagem, o conhecimento extraído dos dados de treinamento é dividido em várias máquinas.

Das três alternativas listadas acima, a mais comumente usada é a primeira: pré-processamento. Embora, seja importante destacar a última, ensemble, pois essa tem alcançado resultados superiores quando comparada às demais (artigo).

E para tarefas multi-classe?

A questão fica um pouco mais sutil, quando temos mais de duas classes. Veja o exemplo na figura a seguir.

Observando essa imagem, podemos dizer que a classe verde é minoritária em relação à classe azul e majoritária em relação à classe vermelha. Assim, a relação entre as classes já não é tão óbvia quanto em problemas com duas classes. Além disso, o cálculo do IR, conforme descrito anteriormente, não representa uma medida tão confiável. Isso acontece porque diferentes conjuntos de dados podem ter o mesmo IR, desde que, a proporção, entre a quantidade de padrões na classe com mais exemplos e a quantidade de padrões na classe com menos exemplos, seja mantida. Note que, o IR do exemplo com três classes, é o mesmo do exemplo com duas classes: 10; pois, no cálculo do IR, o número de exemplos nas demais classes (que não seja a classe majoritária e a classe minoritária) não é levado em consideração. Mas, existem outras formas de calcular o IR, por exemplo: dividindo o número de exemplos na classe majoritária pela soma das quantidades de padrões de todas as outras classes. Assim, o IR para o problema para três classes ficaria igual a 3,33, ou seja, cem padrões da classe azul dividido por trinta (20 padrões da classe verde mais 10 da classe vermelha).

É relevante destacar, que essa questão do desbalanceamento entre classes, é mais grave quando lidamos com tarefas que dispõem de poucos padrões. Para tarefas, nas quais o número de padrões é extremamente alto para todas as classes, essa questão é minimizada. Ao acessar muitos padrões, podemos construir um conjunto de treinamento balanceado, basta realizar undersampling na classe majoritária.

Além disso, o desbalanceamento, por si só, não representa um problema! Basta que as classes (mesmo que desbalanceadas) estejam bem separadas no espaço de características, consequentemente, a tarefa da máquina de aprendizagem será bem simples. Veja, que no exemplo acima, as classes vermelha e verde, embora desbalanceadas, são linearmente separáveis. Logo, um Perceptron (uma reta) seria suficiente para realizar uma classificação perfeita dos exemplos dessas classes. A dificuldade emerge quando, além de desbalanceadas, as classes se sobrepõem. Observe que as bordas, entre as classes vermelha e azul e entre as classes azul e verde, são mais complexas de serem definidas.